No dia 24 de janeiro de 2004 nascia o Orkut. Pouco tempo depois disso, a nossa história começou.
Eu estava na praça de alimentação de um shopping da cidade em um dia qualquer de 2005, pouco mais de um ano após o lançamento da rede social, e um dia depois que a minha professora de inglês chamava a atenção para a popularização dos celulares. “Se você vai em uma praça de alimentação e olha para as mesas, fica espantado com a quantidade de adolescentes com um telefone”, dizia ela. E eu estava justamente reparando naquilo quando uma amiga sentada à minha frente na mesa quebrou o silêncio e perguntou:
— Você já ouviu falar do Orkut?
Olhei para ela e questionei:
— O que é isso?
E ela pôs-se a explicar que era um site onde a gente encontrava amigos antigos e entrava em comunidades sobre coisas que gostávamos. Falando daquele jeito, o tal site não me chamou muito a atenção, mas me deixou curioso. Até que ela disse:
— Pena que precisa de convite pra entrar. E eu não tenho mais nenhum para oferecer.
E isso aumentou a minha curiosidade.
Precisei esperar o fim de semana para pesquisar o que era esse Orkut. Ah! Eu precisava esperar o fim de semana porque a internet era discada, e daí acessá-la custaria menos. Quando não foi a surpresa que, ao entrar no meu e-mail, tinha lá um convite do Orkut feito por essa amiga. Entrei.
O que eu vivenciei nos fins de semanas seguintes foram sábados e domingos inteiros em frente ao computador descobrindo comunidades, procurando antigos amigos e fazendo novos, enviando e recebendo depoimentos, comentando nos fóruns e vendo fotografias (isso era mais difícil porque a conexão sempre caía. Fotos eram pesadas demais).
Como eu, pelo menos 40 milhões de brasileiros vivenciaram isso e tornaram o Orkut a maior (e primeira, pra muita gente) experiência em rede social. Essa experiência, para especialistas, é um retrato da própria cultura brasileira, que na internet foi se desenvolvendo no Orkut.
A plataforma do Google consolidou-se, por anos, como o principal site brasileiro e, enquanto o mundo começava a descobrir o Facebook, por aqui a rede de Mark Zuckerberg demorou a ficar conhecida.
O diretor do Centro de Tecnologia da FGV-RJ, Ronaldo Lemos, afirma que a memória digital do país está registrada no Orkut e precisa ser preservada. “É preciso preservar o conteúdo integral do Orkut. Criar um espelho público do site que registrou boa parte do que aconteceu nessa incrível década passada. Década em que muitos brasileiros isolados na geografia ou socialmente puderam conviver no mesmo espaço, trazendo suas esperanças e conflitos”, disse em um artigo publicado na revista Trip.
Neste mesmo artigo, Ronaldo conta que a biblioteca do Congresso dos Estados Unidos está preservando o conteúdo gerado pelo Twitter: “Estão sendo preservados os mais de 55 milhões de tuítes enviados todos os dias. O conteúdo atingiu 167 terabytes, espaço equivalente a 21 milhões de livros. Apesar dos números astronômicos, o custo é relativamente baixo, já que o armazenamento digital fica cada vez mais barato”. Ele justifica a necessidade de seguir este exemplo no Brasil: “Esses sites (Orkut em especial) refletem não só o presente, mas a memória detalhada das mais diversas e fascinantes relações sociais”.
Mas assim como os celulares não são mais “tijolões” azuis (daqueles que a minha professora tanto se espantava em ver com os adolescentes), a rede social preferida do país não é mais o Orkut. Hoje ela é a quinta rede do Brasil, com 6 milhões de usuários ativos (contra 76 milhões do Facebook, o primeiro colocado). E ainda que as pessoas lembrem com carinho das experiências que só o Orkut proporcionava (scraps e visitantes recentes, por exemplo), a plataforma do Google, recentemente, serviu até como base para a criação de um adjetivo pejorativo para a inclusão social: orkutização.
Hoje, quase dez anos depois, reflito: naquele instante, naquele shopping em 2005, eu estava vivendo os primeiros passos da inclusão digital: celulares na mesa e a primeira conversa sobre uma rede social. Dez anos mais tarde, as mesmas mesas antes cheias de celulares “tijolões” pré-pagos azuis estariam ainda mais cheias, mas, dessa vez, com smartphones conectados em outra rede. E o Orkut já seria quase passado.
Em tempo: para que a internet e as redes sociais ficassem acessíveis, era necessário, primeiro, que os computadores pessoais (PCs) também fossem popularizados. O primeiro passo para isso foi a criação do Macintosh, que hoje completa 30 anos.
Sem ele, provavelmente não estaríamos comemorando os dez anos de Orkut. Ou, pelo menos, o Orkut ainda não teria nascido.
Por Juliano Reinert, Jornalista da equipe de Conteúdo da Humantech
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